Proposta do Guia Alimentar para a População Brasileira 2014

7/08/2014 - 10:08

A proposta do Guia Alimentar para a População Brasileira 2014, apresentada pela Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição (CGAN) do Ministério da Saúde e colocada em CONSULTA PÚBLICA N° 4, DE 6 DE FEVEREIRO DE 2014, foi analisada pelos Conselhos Regionais e Federal de Nutricionistas (CRN/CFN), os quais, além das contribuições individuais encaminhadas na forma e prazo estabelecidos na referida consulta pública, entenderam oportuno oferecer considerações complementares que ora são apresentadas. O texto em referência é fruto das discussões encetadas nos CRN, que contou com convidados da academia, estudantes, profissionais, outras entidades e instituições da área de alimentação e nutrição. Tais reflexões apresentadas em reunião, de nível nacional organizada pelo CFN, subsidiaram a presente manifestação que expressa a posição dos conselheiros regionais e federais do sistema CFN/CRN, cujos mandatos são representativos dos 100 mil nutricionistas brasileiros.

Foi reconhecido o valor de proposta que assume, de forma inovadora, o enfrentamento dos aspectos negativos da transição nutricional que afeta a população brasileira; considerou-se que esse enfrentamento deve ser encarado como ação prioritária para todos os segmentos da sociedade ligados aos problemas, o que justifica o presente posicionamento. A proposta em análise apresenta pontos positivos quando altera o paradigma das mensagens que pretendem modificar o perfil epidemiológico das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT). Ao focar os alimentos, e não os nutrientes, agiliza a comunicação e facilita escolhas que favorecem uma boa alimentação. Concordou-se com a ênfase na necessária mudança do perfil de oferta e consumo de produtos industrializados e com a prioridade que deve ser dada ao consumo de alimentos in natura, em detrimento daqueles com baixo valor nutricional e ricos em açucares, gorduras e sal.

Entendeu-se como muito positiva a proposta que, alinhada com recomendações internacionais que preconizam o resgate da função social dos alimentos, valoriza o comer em família e o preparo doméstico das refeições, favorecendo o fortalecimento de vínculos familiares, a expressão do papel social da alimentação e a preservação da cultura, da tradição e do conhecimento popular. Compartilha-se do reconhecimento de obstáculos inerentes a consecução dessa proposta, ainda que as sugestões oferecidas pelo documento para a sua superação mereçam um tratamento mais articulado com as mudanças estruturais no sistema alimentar e no modo de vida das famílias.

Foi ainda considerado oportuno o tratamento genérico que o texto dá às questões da promoção da alimentação adequada e saudável, propondo ações que indicam condutas comportamentais, individuais e coletivas que oportunizam a participação de profissionais de todas as áreas que têm interface com a alimentação.

Entretanto, as discussões levadas a efeito no sistema CFN/CRN concluíram unanimemente que a proposta em estudo apresenta desafios que devem ser superados anteriormente a divulgação do texto, sob pena de comprometer a sua credibilidade e reduzir a sua efetiva utilização. Dentre elas destaca-se:

• O Guia Alimentar proposto está centrado em inovadora classificação dos alimentos, estruturada a partir de fundamentos teóricos cuja aplicação prática não foi testada. Esta circunstância pode explicar a inconsistência que se observa na linguagem adotada – ora coloquial, ora técnica – e que se reflete na indefinição do público a que se destina, na inconsistência de conceitos e definições expressos ao longo do texto, na insuficiência de exemplos e na inadequação de ilustrações.

• A mensagem básica da proposta foca o empoderamento do indivíduo para que este faça escolhas compatíveis com a nova orientação, mas omite os fatores que condicionam tais opções, desconsiderando as necessárias medidas para promover, permitir, sustentar e consolidar escolhas individuais e coletivas. Ao abstrair os determinantes sociais (sistemas alimentares que interferem no acesso aos alimentos de qualidade, propaganda, etc.), ignora a sua interferência no padrão alimentar do indivíduo e da população. Documento da própria CGAN afirma que “a prática autônoma e voluntária de hábitos alimentares saudáveis depende de ações articuladas entre as dimensões voluntárias, que o indivíduo pode definir e alterar e aquelas estruturais, que o ambiente determina e possibilita”.

• A proposta em estudo define três componentes básicos da alimentação: os alimentos, os produtos alimentícios entendidos como os ingredientes que permitem temperar e cozinhar os alimentos e os produtos alimentícios prontos para consumo. Tal classificação não encontra respaldo na literatura científica, nem na legislação sobre alimentos e sua adoção implicará em alterações no conjunto de regulamentos que regem a produção e comercialização de alimentos e na prática de inúmeros profissionais que atuam na área.

• Quando preconiza que os alimentos industrializados devem ser evitados desconsidera a necessidade de consumo de alguns desses alimentos, especialmente associada às dificuldades de acesso de algumas regiões do país.  Minimiza o papel do Estado na fiscalização das determinações legais e sanitárias aplicáveis a essa atividade e desconsidera a necessária regulamentação para que o setor de indústria e comercialização de produtos alimentícios assuma a responsabilidade social que lhe cabe no enfrentamento ora proposto. A publicidade de alimentos adota valores e práticas que resumem e traduzem os desafios atuais para a adoção de uma alimentação saudável. Assim, sua regulação, enquanto papel do Estado, merece destaque para que possa ser ampliada a base social de apoio à proposta em estudo e, ao mesmo tempo, permita controlar o impacto negativo que a propaganda pode exercer sobre os hábitos alimentares.

• Outro desafio identificado foi a insuficiente abordagem do protagonismo que o Guia Alimentar deve ter nas políticas e programas da área de alimentação e nutrição, comprometendo sua função de instrumento inspirador e irradiador para a promoção de alimentação adequada e saudável.

Foi ainda discutida a forma adotada para a construção da proposta em estudo, que deveria ter tido maior abrangência, contemplando diferentes segmentos da sociedade, e ter explicitado o possível impacto que o Guia Alimentar atualmente em vigor exerceu no padrão alimentar da população brasileira. Destacou-se a necessidade de testar essa nova mensagem cujo entendimento é indispensável para a sua plena adoção. Esta circunstância determina que as contribuições da Consulta Pública recentemente encerrada sejam amplamente consideradas na elaboração do texto definitivo.

Concluindo, o sistema CFN/CRN referenda a iniciativa que propõe novas bases para o enfrentamento da problemática alimentar que afeta a população brasileira, mas recomenda que o texto em estudo seja submetido a criteriosa revisão da abrangência e exequibilidade dos pressupostos teóricos que adotou. Recomenda-se ainda que seja definido o público a que o texto se destina, pré-requisito indispensável para a necessária adequação do conteúdo e da forma final do documento.

Brasília, 28 de julho de 2014.

Conselhos Federal e Regionais de Nutricionistas

Compartilhe:

Veja também



Fale Conosco

X

Enviando seu email...

Email enviado com sucesso!

slot gacor skybet88 slot online skybet88 skybet88 skybet88 slot gacor skybet88 skybet88 slot bonus new member skybet88 slot shopeepay skybet88 skybet88 skybet88 slot shopeepay slot gacor skybet88 demo slot skybet88 skybet88 skybet88 skybet88 skybet88 skybet88 mgs88 mgs88