Artigo: “Inserção da Agricultura Familiar x Agricultura Orgânica x Agroecologia”
24/09/2014 - 10:09
Por Zelice Maria de Melo Pessoa
No Ano Internacional da Agricultura Familiar Camponesa e Indígena, a participação social nas discussões sobre Agricultura Familiar, modelos e práticas de produção agroalimentar, são fundamentais para a garantia da Segurança Alimentar e Nutricional e de seus marcos legais, reconhecendo como irrevogável o Direito Humano à Alimentação Adequada e a Soberania Alimentar. Neste contexto, este breve artigo busca convidar o nutricionista ao empoderamento sobre esse tema, articulado com a prática profissional.
O termo Agricultura Familiar é amplo e não representa um todo homogêneo, podendo incluir vários modelos de agricultura, cujos donos não sejam as grandes corporações ou investidores (Harare, 2014). Inclui pequenos produtores, possui caráter familiar, pois são operados pela mão de obra familiar (homens e mulheres) e estão ligados a diversas áreas do desenvolvimento rural, tais como: pastoril, pesqueira, agrícola, dentre outras. A agricultura familiar abastece os mercados internos em países subdesenvolvidos, desenvolvidos e em desenvolvimento, e tem um importante papel socioeconômico, cultural e ambiental. No Brasil, quase 80% da produção de alimentos que compõem a cesta básica, segundo Censo agropecuário de 2006, são provenientes da agricultura familiar.
Nos últimos anos, emerge vasta discussão sobre os modelos e as práticas de sistemas agroalimentares. A agricultura convencional ou moderna, proveniente da chamada “Revolução Verde”, apresentou-se como a solução para o aumento da produção e oferta de alimentos. Caracterizada pela mecanização do campo, utilização de produtos químicos nas lavouras – agrotóxicos, sementes transgênicas e monocultura extensiva para exportação, induziu muitos agricultores familiares a adotarem o pacote tecnológico como forma de obtenção de recursos financeiros e aumento da produção. Vale destacar que esse processo de modernização da produção agrícola veio acompanhado de políticas públicas para o setor – crédito rural – destinado a todos os segmentos dos produtores rurais e, na prática, beneficiou os grandes proprietários de terra.
Diante dessa realidade, o agricultor familiar se depara com a dificuldade em plantar, devido ao desgaste do solo, a contaminação do meio ambiente, a falta de crédito, o monopólio da terra e outros bens naturais em mãos de pequenos e poderosos grupos, principalmente corporações transacionais [dentre outras, Monsanto, Cargill, Syngenta]; torna-se refém dos financiadores do sistema agroexportador.
Para responder aos danos econômicos, sociais e ambientais gerados por esse modelo de produção, movimentos em favor de uma agricultura sem a utilização de insumos químicos e pacotes tecnológicos têm resgatado as boas práticas na lavoura, com um modelo de produção de base orgânica ou agroecológica. É importante esclarecer que o termo – Agricultura Orgânica – refere-se à produção sem o uso de agroquímicos ou transgenia, é baseada na compostagem de matéria orgânica, na adubação exclusivamente orgânica, reciclagem de nutrientes e na rotação de culturas, porém não inclui os princípios éticos da agroecologia. (Wolf, 2009)
No modelo agroecológico, a produção baseia-se na agricultura sustentável, pautada nos saberes e métodos tradicionais de manejo da terra, propõe alimentos seguros, saudáveis, valoriza a cultura alimentar, estimula a diversidade ambiental e a aproximação do homem com a natureza. Além disso, a agroecologia prima pelos princípios éticos e sociais de gênero, valorando e significando o trabalho das mulheres camponesas com os mesmos direitos em relação aos homens. (Abrandh, 2013)
No sistema produtivo agroecológico, o agricultor familiar retoma a sua base de recursos de maneira autônoma, fazendo uso de sementes crioulas, o manejo dos recursos naturais de forma sustentável, o cooperativismo e associativismo e a valorização de seus produtos, uma tendência do mercado internacional. Além disso, estabelece circuitos curtos de comercialização e estabelece a conexão entre agricultor e consumidor, através da venda direta em feiras livres e mercados locais, garantindo a oferta de alimentos norteados pelos princípios da Soberania Alimentar e do Direito Humano à Alimentação Adequada.
Referências:
– O Direito Humano à Alimentação Adequada e o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional/ organizadora, Marília Leão. – Brasília: ABRANDH, 3013. p.24
– WOLF, Luis F. Agricultura Ecológica. 2009. Disponível em :http://www.agirazul.com.br/wolff.htm
– Soberania Alimentar e Comércio. Posicionamento da Via Campesina no Ano Internacional da Agricultura Familiar – 2014. Harare. Junho de 2014. Disponível em: http://www. viacampesina.org/es/índex.php
SOUZA, A.P. de O., ALCÂNTARA, R.L.C. Inserção da pequena agricultura familiar no mercado de nichos: o caso da AGRECO no Estado de Santa Catarina- BR. Santa Catarina,
Sugestão de sites:
– ARTICULAÇÃO NACIONAL DE AGROECOLOGIA (ANA). Soberania e Segurança Alimentar na construção da Agroecologia. Disponível em: htt//www.agroecologia.org.br/publicacoes/agroecologia.
– Ministério da Saúde, disponível em: http://nutricao.saude.gov.br/publicaçoes.php
– Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) – Novo relatório sobre a Fome. Disponível em: https://www.fao.org.br
– CONSELHO NACIONAL DE SEGURANÇA ALIMENTAR (CONSEA). Terra: direitos patrimoniais e territoriais. Disponível em: htt//www4.planalto.gov.br/consea/planarias
Zelice Pessoa é Nutricionista conselheira do CRN-5. Pertence ao quadro técnico da Secretaria de Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza (Sedes), onde atua há dois anos no Projeto Rede de SAN e Cidadania para gestores públicos e sociedade civil dos municípios da Bahia. Atualmente, faz parte da equipe do Programa Mais Água e Programa Cisternas – construção de tecnologias para captação de água no semiárido baiano. Possui atualização em Acesso à Água e Convivência com o Semiárido – Plataforma Rede de San/FAURGS/UFRGS – 2013/2014.